Dentro das suas contribuições para a engenharia cabe destacar inventos como o moinho de vento, a serra, o relógio mecânico, as represas de água . 04/02/2015 - Autor: eltrinador - Fonte: elespectador.com – Tradução de: Yiossuf Adamgy.
Prezados Irmãos,
Assalamu Alaikum (A paz esteja convosco):
“Inventaram uma grande quantidade de métodos quí-micos como a refinação do açúcar e a destilação dos licores. Dentro das suas contribuições para a engenharia cabe destacar inventos como o moinho de vento, a serra, o relógio mecânico, e as represas de água.”
Os historiadores falam do Médio oriente como a cunha da civilização actual. Ali, desde a pré-história, estabeleceram-se grupos humanos que nos deixaram invenções tão importantes como a escritura ou a roda. Estas civilizações tiveram culturas muito fortes de maneira que, à diferença da Europa de tribos primitivas, quando o império romano chegou ao Médio Oriente, encontraria grande parte das ideias que construíram a sua visão do mundo. Por exemplo, os cultos persas a Mitra, a Dionisio na Grécia e a Jeová em Israel, foram fundamentais para a formação da que depois foi a religião oficial do império: o cristianismo.
As invasões bárbaras ao império romano em 476 submeteram aos seus habitantes a uma crise que encontrou a sua saída na religião. Os bárbaros, depois das invasões, assimilaram os costumes romanos e converteram--se ao cristianismo católico (Clodoveu, rei dos Francos até ao ano 499 e Recaredo dos visigodos em 587) e assim, o clero adquiriu uma força enorme onde a política se converteu num caos, submergindo a Europa num fundamentalismo religioso que duraria quase mil anos. Por essa época, no entanto, na Península Arábica nasceria o Islão, uma cultura que preservaria a maior parte do conhecimento da humanidade e libertaria a cultura ocidental da obscuridade do fanatismo religioso.
O Islão na história começa com as primeiras pre-gações do Profeta Muhammad ﷺ em 622, em Meca, hoje Arábia Saudita. Já no ano 700 os crentes islâmicos tinham estendido o seu poder militar a todo o médio oriente e Norte de África. Quase sem o propor, apro-veitaram a instabilidade política do débil reino visigodo em Espanha, ocupando-o até ao ano 711.
A morte do Profeta Muhammad ﷺ criaria instabilidade nos primeiros anos. Com o tempo, o império dividiu-se em várias regiões autónomas com duas cabeças princi-pais: a ocidental com centro em Córdoba, hoje Espanha, administrada pela dinastia Omíada e a Oriental com cen-tro em Bagdade, hoje Iraque, administrada pela dinastia Abássida. O Islão consolidou Bagdade, com mais de 1.000.000 de habitantes, como a cidade mais importante do mundo no século IX. Deixou no esquecimento o que uma vez foi Roma ou Constantinopla. Al-Mansur, o se-gundo califa Abássida e fundador de Bagdade fez dela um centro cultural sem igual onde se escreveu “as mil e uma noites” e viveu um grupo de cientistas eminentes, um deles Al Hazen quem é conhecido por criar o actual método científico. Foi um perito em lentes e descobriu o mecanismo de formação de imagens no olho. Ali tam-bém viveu o matemático Al-Khuarismi que formalizou a álgebra e a aritmética actual aplicando-a à astrono-mia, economia, engenharia, topografia e disputas le-gais.
“A tinta dos cientistas vale tanto como o sangue dos mártires” reza o Alcorão. É por isto que o califa Harun al-Rashid e os seus sucessores, se preocuparam em encontrar a maior quantidade de conhecimento cientí-fico. Assim, estabeleceu-se, em Bagdad, até 830 a Casa da Sabedoria ou Bayt al-Hikmah onde a maioria dos textos gregos, persas, indianos e chineses que hoje conhecemos, foram traduzidos para o árabe. O papel, invento chinês reservado para as castas, foi adotado e melhorado pelo Islão levando-o a uma maior quantidade de pessoas. A Europa, por outro lado, continuava a uti-lizar pergaminhos e as poucas cópias que tinham dos textos da antiguidade, possivelmente, foram destruídas ao ser consideradas como heresia pelos cristãos fun-damentalistas.
O que era a moderna Casa de Sabedoria de Bagdade, vítima dos bombardeios norte-americanos na ocupação de Iraque em 2003.
Assim, as artes bizantinas e persa, a filosofia gre-ga, a medicina judaica e as matemáticas indianas, foram conhecidas por uma grande quantidade de intelectuais muçulmanos, que viam com respeito as religiões diferentes do Islão. O respeito era tal que, à diferença de outros impérios, os califas não obriga-vam a conversão à sua religião e no império convi-viam muitas pessoas com diferentes pontos de vista.
Assim, no império islâmico, uma cultura cheia de ideias floresceu apoiada por uma rede enorme de mercadores e de peregrinos que trocavam ideias e produtos (para todo o muçulmano, é tradição ir pelo menos uma vez na vida a Meca). Desta maneira, enquanto o resto do mundo vivia no feudalismo, o comércio fez com que a economia islâmica adquiris-se altos níveis de complexidade, com conceitos que o mundo não conheceria senão muito depois: che-ques, notas, contabilidade, fideicomissos, contas de aforro e correntes, taxas de frete, impostos. Segun-do os economistas, o mundo islâmico seria a pri-meira cultura com um capitalismo primitivo.
O império desenvolveria uma grande complexidade nas suas técnicas agrárias. Inventaram a rotação de cultivos e reverdesceram o deserto utilizando águas subterrâneas. Cultivaram algumas plantas asiáticas como o algodão, arroz e a cana-de-açúcar levando- -as para a Europa, assim como outras europeias como a vide, a oliveira e alguns citrinos que levaram para a China. Inventaram alguns métodos químicos como a refinação do açúcar e a destilação dos lico-res. Dentro das suas contribuições para a engenha-ria cabe destacar inventos como o moinho de vento, a serra, o relógio mecânico e as represas de água, impulsionadas pela construção de majestosos palá-cios, mesquitas e edifícios do estado.
A parte oriental do império, no entanto, deteve su-bitamente o seu progresso ao enfrentar as invasões do povo Turco Seljúcida até ao ano 1030, que ainda que se tenham convertido ao Islão, modificou tre-mendamente as ideias do povo. O tiro de graça à cul-tura do Médio Oriente, deu-se em 1258, quando Bag-dade foi devastada, até ao último muro, pelos mon-góis. No entanto, a semente da cultura islâmica origi-nal sobreviverá, um pouco mais, no extremo ociden-tal do império: Al-Andaluz. A sua capital, Córdoba, herdou a majestosidade de Bagdade chegando, por muitos anos a ser a cidade maior e mais adiantada da Europa com quase 500.000 habitantes, 700 mes-quitas, 60.000 palácios e 70 bibliotecas, a maior das quais chegou a ter 600.000 livros.
Será em Espanha onde a pluralidade de ideias con-tinuou. Ali conviviam, em harmonia, cristãos, judeus e islâmicos. Instaurou-se uma das grandes figuras da filosofia islâmica que influenciaria, determinantemente, o movimento do renascimento que floresceu na Europa no século XVI. Trata-se de Averróis, um estudioso das ideias de Aristóteles, nascido em Córdoba em 1126, que teve a ousadia de propor que a verdade religiosa devia ocupar-se de assuntos diferentes da verdade científica. Um dos seus discípulos, o médico judeu Maimónides, nascido também em Córdoba em 1138, é considerado o maior pensador Judeu desde Moisés influenciando, enormemente, o Talmude e refinando algumas técnicas médicas da época.
Em Bagdade desenvolveu-se quase toda a álgebra actual mas aperfeiçoou-se em Córdoba para logo se trasmitir a toda a Europa. Em Córdoba desenvolver-se-ia a geometria esférica. Eles conheciam, a partir de textos gregos, que a Terra é redonda e sabiam fazer uma estimativa muito boa do seu diâmetro. Então, resolvendo o problema de calcular a direcção para a qual se encon-trava Meca da cidade de Córdoba, sabendo as coor-denadas geográficas de ambas as cidades (os muçul-manos devem orar diariamente com o seu olhar na di-recção de Meca), implementaram-se algoritmos mate-máticos e técnicas de geometria usadas amplamente pelos navegadores e geógrafos posteriores. Sem estas técnicas, teria sido impossível para Colombo deslocar-se no Oceano Atlântico.
No entanto, o esplendor de Al-Andaluz foi fortemente perturbado pela campanha de reconquista empreendida pelos reinos cristãos do Norte. A Espanha islâmica resultou irresistível para os cristãos, assim como o foi Roma para os Bárbaros. É então quando muitos mercenários cristãos encabeçaram escaramuças peque-nas para se apropriarem das suas riquezas. Um dos mercenários mais célebres, Rodrigo Díaz, melhor co-nhecido como El Cid exemplifica o afã daqueles que sonhavam sair a pé das suas cidades e regressar reple-tos de riquezas. A maior parte deles, fazia-o.
Em 1254, o Rei Afonso X do reino cristão de Castela, quando a campanha de escaramuças tinha debilitado a economia de Al-Andaluz, compreendeu que estava a enfrentar um rival com muitos conhecimentos. É então que empreende um labor definitivo para o futuro da Europa: traduzir a maior quantidade de textos árabes e judaicos para uma língua comum para os habitantes do seu reino: o castelhano. Desta maneira, os conheci-mentos de ciência e filosofia da cultura islâmica resulta-ram acessíveis para uma população muito maior, mais além dos intelectuais muçulmanos e não só espanhóis, mas também para o resto da Europa.
O ocaso do império culminaria com a conquista cristã do seu último enclave: Granada. Uma vez recuperada a península ibérica, os reis católicos Isabel de Castela e Fernando de Aragão em 1492 decretaram a imediata expulsão de Judeus e Mouros (islâmicos que viviam em Espanha). Os mouros iriam não sem antes deixar o último vestígio da majestosidade islâmica: o palácio-fortaleza de “la Alhambra”, quem sabe o monumento mais conhecido de Espanha e uma maravilha para a sua época. Construído sob os preceitos islâmicos de não incluir figuras humanas ou animais, este edifício recria uma complexidade geométrica que reflecte conhecimen-tos matemáticos avançados. O edifício, no meio de um planalto árido, é decorado com canais de água fluindo vistosamente.
A expulsão dos Judeus por um édito e de islâmicos por meios militares às mãos dos reis significou uma perda de riqueza humana para a península ibérica mas resultou uma nutriente e de facto uma causa crucial para a posterior revolução intelectual da Europa no século XVI que conhecemos como renascimento. Exilados em diferentes países da Europa, levaram o seu conheci-mento, principalmente para Itália e abriram os olhos das sociedades Europeias aos conhecimentos próprios e da antiguidade.
Hoje em dia, tristemente, a situação tomou um rumo si-milar ao que tomou depois da queda de Roma mas com papéis trocados. A civilização Ocidental é a herdeira do conhecimento científico e tecnológico enquanto o mundo islâmico, vítima de guerras que arrasaram as suas cida-des como o fizeram os bárbaros com o império Romano, do mesmo modo que o que ficou deste, sucumbe ante o fanatismo religioso. Devemos muito do que somos à cul-tura islâmica, se eles não tivessem preservado o conhe-cimento antigo, seguramente os nossos progressos cien-tíficos teriam demorado centenas de anos. A principal virtude do império islâmico, do mesmo modo que o ro-mano e muitos outros na história foi também a sua condenação: a sua riqueza.■
Obrigado. Wassalam.
M. Yiossuf Adamgy - 05/02/2015.