Por Dr. Jasser Auda — Versão portuguesa: M. Yiossuf Adamgy
Saúdo-vos com a saudação do Islão, "Assalam alai-kum", (que a Paz esteja convosco), que representa o sincero esforço dos crentes por estender o amor e a tolerância entre as pessoas, seja qual for o seu idioma, crença ou sociedade.
A questão das mulheres representa o verdadeiro teste para a atual reforma Islâmica. O motivo para tal é a diferenciação infundada e injusta entre homens e mulheres, profundamente enraizadas nas muitas opiniões populares que herdamos das eras do declínio da civilização Islâmica.
Antes de mais, é necessário proceder às seguintes
1. Entre Islão e Muçulmanos
2. Entre a Charia e as madhhabs Islâmicas ou escolas de jurisprudência (islâmicas)
3. Entre as Transcrições e as interpretações das Transcrições
1. Entre Islão e Muçulmanos - Primeiro, devemos diferenciar entre Islão e Muçulmanos. Isto não acarreta necessariamente um sentido negativo. Todavia, é crucial que separemos (tanto quanto possível) entre a Religião, Islão, e os seus seguidores, Muçulmanos. O que os Muçulmanos fizeram, ou fazem atualmente, não é necessariamente aquilo que o Islão é.
O Islão possui uma essência que todo o Muçulmano deve abraçar. Contudo, para além dessa essência, a mesma religião, Islão, pode manifestar-se, e manifestou-se, numa variedade de aspectos e formas em várias culturas. Algumas dessas culturas possuíam estruturas sociais geralmente anti-mulheres, e os verdadeiros eruditos esforçaram-se por implementar os valores Islâmicos de justiça e igualdade dos seres humanos.
Um exemplo é a prática de proibição da entrada das mulheres Muçulmanas nas Mesquitas, apesar da clara instrução do Profeta Muhammad (que a paz e as bênçãos estejam com ele): “Não impeçam as servas de Allah de irem às Mesquitas de Allah” (Al-Bukhari), e não obstante o facto de o Profeta (que a paz e as bênçãos estejam com ele) ter liderado a Oração para muitos homens e mulheres, na sua própria Mesquita (alinhando as mulheres atrás dos homens).
Outro exemplo contemporâneo é a proibição das mulheres conduzirem carros em alguns países Islâmicos, apesar de séculos de práticas semelhantes empreendidas por mulheres Muçulmanas, a começar pela esposa do Profeta (s.a.w.), `A'ishah (r.a.), a qual liderou toda uma batalha montada no seu camelo (A Batalha do Camelo, ou Mawqi`at Al-Khamal). São muitos os exemplos neste domínio.
Do mesmo modo, é importante diferenciar entre Islão e a história do mundo Islâmico, o que pode ter os seus lados positivos, assim como negativos, no que Nós, Muçulmanos, temos que admitir que exista uma imensa bagagem anti-mulheres na história do mundo Islâmico a qual é, simplesmente, não Islâmica, tendo em conta as referências e fontes de legislação do Islão.
Um exemplo é o do conceito de “harém”, em que um homem rico ou pobre basicamente encarcera um vasto número de mulheres para seu próprio prazer, com o nome de concubinas. Damos graças a Deus por esse costume não Islâmico não mais existir.
Outro exemplo é o de honrar as matanças que continuam a acontecerem, algumas “em nome do Islão” em determinados lugares (conforme acontece no Paquistão, na Nigéria e na Jordânia dos dias de hoje), não obstante o fato de ser claramente contra o Islão e não ter precedentes na lei Islâmica.
Além disso, é necessário diferenciar entre Islão e as políticas dos Muçulmanos. O Islão trata-se de um modo de vida que, naturalmente, inclui políticas e governos. Todavia, as posições políticas, ainda que baseadas em determinados valores Islâmicos, não são necessariamente parte do “Islão” que todo o Muçulmano deve abraçar. Quando se trata das mulheres, existe um laço subtil, ainda que extrema-mente forte, entre muitas das fatwas anti-mulheres (como as atrás referidas) e determinados programas políticos.
2. Entre a Charia e as madhhabs
A segunda importante diferenciação é entre a Charia e as escolas de jurisprudência Islâmicas (em Árabe: madhahib al-fiqh). Na língua Inglesa, (porque não dizer no Ocidente) a palavra Charia tem conotações negativas, visto ser comumente usada em referência a vários castigos corporais praticados, em alguns países, em nome da lei Islâmica, castigos esses normalmente, infelizmente, aplicados aos fracos e pobres dessas sociedades, e que não são aplicados aos ricos ou politicamente poderosos.
Contudo, no Alcorão a palavra Charia é usada para significar apenas “o caminho celestial revelado ou modo de vida” (Alcorão, 5:48, 45:18). Assim sendo, tudo acerca do Islão é Charia. É suposto tratar-se do “modo de vida” Islâmico.
Quanto às escolas de fiqh, a palavra fiqh é usada no Alcorão e nos Ahadith de várias maneiras para se referir ao entendimento, à compreensão e à obtenção do conhecimento da religião em geral (por exemplo, Alcorão 4:78, 6:25, 9:122). Contudo, nas escolas Islâmicas da lei, a palavra fiqh normal-mente tem sido definida como “o conhecimento das sentenças práticas”.
É essencial saber que a Charia foi revelada, mas que o fiqh não! A Charia é o que Deus disse e que o Profeta (que a paz e as bênçãos estejam com ele) instruiu cada Muçulmano a fazer, mas fiqh é a compreensão dos eruditos, em diferentes eras e localizações geográficas, do conhecimento revelado e a sua opinião nas suas tentativas de aplicar a Charia à (sua) verdadeira vida.
Assim sendo, e falando de um modo geral, o fiqh está sujeito à sociedade e às circunstâncias em que foi aplicado, e poderá não representar (necessariamente) os mandamentos de Deus e nem (necessariamente) o que devemos fazer nas nossas atuais circunstâncias.
Evidentemente, existem questões no Islão que são universais e que cada Muçulmano, indiferentemente de onde e como está, deve aplicar. Devemos consultar os eruditos de fiqh nestas áreas. Todavia, refiro-me aqui às questões relativas a mudanças e, especialmente, questões relativas às mulheres, as quais, a meu ver, sofreram imensas descriminações de vários eruditos – contrárias à Charia Islâmica ou modo de vida revelado.
3. Entre as Transcrições e as interpretações das Transcrições
A terceira importante diferenciação é entre as Transcrições e a interpretação das Transcrições. As Transcrições são universais, mas as suas interpretações variam com a mudança do tempo e as circunstâncias.
Todavia, existem limites quanto ao que pode ser uma interpretação válida. Uma interpretação válida não pode, por exemplo, alterar o significado de algo, inclusive acabar por o alterar, até acabar por obter algo radicalmente diferente do que foram os ensinamentos óbvios da Transcrição ou a tradição óbvia do Profeta do Islão (que a paz e as bênçãos estejam com ele).
A este respeito, torna-se necessário compreender como determinadas interpretações históricas moldaram o Islão nas mentes de muitos Quem não pretender continuar a receber estas reflexões, por favor dê essa indicação e retirarei o respectivo endereço desta lista.
Obrigado. Wassalam.
M. Yiossuf Adamgy - 13/08/2015 - Jumua Mubaraka para todos!
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