A cidade de Meca é conhecida por ser um local sagrado para o Islam, o que se deve a uma série de fatores. Lá está erguida a Caaba, o templo sagrado construído pelos profetas Abraão e Ismael, e também é a terra de origem do Profeta Muhammad ﷺ.
Em Meca, ocorreram vários acontecimentos sagrados que são de extrema importância para a fé islâmica. Não é à toa que dois dos cinco pilares sagrados do Islam estão ligados a esta cidade: a oração e a peregrinação.
Todos os dias, os muçulmanos têm o dever de realizar cinco orações. Estas preces devem ser feitas em postura correta e a pessoa que estiver orando deve estar virada para a direção certa, que é chamada de qibla, e sua referência é a Caaba.
Além disso, os muçulmanos que possuem condições de fazer a peregrinação à Meca devem fazê-lo pelo menos uma vez na vida. Lá, eles devem circundar a Caaba e fazer atos de adoração nas colinas de Safa e Mawra, além de beber as águas de Zamzam.
Ao longo do tempo, a cidade de Meca ganhou uma grande infraestrutura para receber o número de muçulmanos que participam anualmente da grande peregrinação. No entanto, no princípio esta realidade era muito diferente.
Na ocasião em que o Profeta Abraão caminhou pela região onde hoje está a cidade, Meca era apenas um deserto arenoso, onde os recursos necessários para a sobrevivência, como água e comida, eram bastante escassos.
Com o passar do tempo, a cidade esteve na mão de diversas tribos e impérios. São muitos detalhes, no entanto, a história de Meca reflete parte importante da trajetória do Islam ao longo dos séculos.
A fundação de Meca
Meca não possui muitos registros históricos anteriores ao nascimento do Profeta Muhammad ﷺ, mas, para a tradição islâmica, a origem de seu povo remonta à linhagem que o liga ao Profeta Ismael, filho do Profeta Abraão.
A cidade foi destinada por Deus a ser um local de adoração monoteísta. No Alcorão, Allah havia deixado clara a sua vontade de que o lugar fosse um destino da peregrinação dos muçulmanos.
“E (recorda-te) de quando indicamos a Abraão o local da Casa, dizendo: Não Me atribuas parceiros, mas consagra a Minha Casa para os circungirantes, para os que permanecem em pé e para os genuflexos e prostrados. E proclama a peregrinação às pessoas; elas virão a ti a pé, e montando toda espécie de camelos, de todo longínquo lugar, para testemunhar os seus benefícios e invocar o nome de Deus, nos dias mencionados” (Alcorão Sagrado 22:26-28)
No entanto, com o passar do tempo, o povo de Meca desobedeceu a Allah e, aos poucos, o local foi se tornando um território de idolatria e adoração a estátuas com imagens de deidades.
Na época em que viveu o Profeta Muhammad ﷺ, a cidade estava sob o domínio da tribo coraixita, que era formada sobretudo por comerciantes que lucravam com diversas atividades, inclusive com a peregrinação, que naquela época era bastante praticada pelos politeístas.
A cidade, além de ser um forte ponto comercial, também era um dos poucos lugares habitáveis na região do imenso deserto árabe, devido à presença de água nos poços de Zamzam.
O local só resgatou sua origem monoteísta após ser conquistado pelo Profeta Muhammad ﷺ e seu exército de muçulmanos. Desde então, para proteger a cidade da influência dos idólatras, não é permitido que seguidores de outras religiões, a não ser do Islam, entrem na cidade.
A partir dali, Meca se tornou conhecida pela sua importância para os muçulmanos e resgatou seu propósito de ser um local de peregrinação para adorar ao Deus único.
O período dos califas
Meca nunca foi a capital política de nenhum califado islâmico. Ao longo dos séculos, sua importância se manteve apenas como local sagrado. Durante o período do califa Abu Bakr, Umar e Uthman, a capital do estado islâmico ficou localizada em Medina.
Naquele período, as mudanças em Meca foram poucas. Elas começaram a surgir no período de Umar. Cerca de 10 anos após a hégira, o Islam já havia crescido consideravelmente e a Caaba começou a ficar pequena para receber os peregrinos. Foi então que o califa decidiu comprar as casas em volta do templo e construiu pequenos muros na Mesquita al-Haram.
Umar também chegou a fechar os poços de Zamzam durante o Hajj, mas depois mudou de ideia e reabriu a parte mais baixa e a mais alta do vale para receber os peregrinos.
Após a morte de Umar, o seu sucessor, o califa Uthman conseguiu adquirir mais terras, aumentou o território que cercava a Caaba e construiu galerias em torno da Casa Sagrada.
Sob o domínio do Califado Omíada, a cidade viveu períodos conturbados. Ao todo, foram dois cercos que causaram grandes prejuízos para a Meca. Estas batalhas foram causadas para decidir quem iria suceder o controle do califado.
O primeiro deles foi no ano de 683, quando bombardearam a cidade com pedras durante a batalha entre as tropas do califado e Ibn Zubair, que arrasou Meca. Durante o cerco, a estrutura de madeira da Caaba foi incendiada e as estruturas da Casa Sagrada foram danificadas.
No segundo cerco, Meca foi novamente bombardeada pelo general Hajjaj e, desta vez, a Caaba foi completamente destruída por causa da ofensiva. Novamente, a cidade havia ficado arruinada e precisou ser reconstruída durante o reinado seguinte.
Meca Otomana no século XIX
A partir de 920, um grupo sincrético religioso chamado de Carmatas começou a impedir a passagem dos peregrinos vindos do Iraque, da Síria e de outros cantos da arábia. Somente aqueles que vinham da direção do Egito podiam ir até a cidade sagrada.
Em 930, a seita saqueou Meca e roubou a Pedra Negra da Caaba. O objeto sagrado desapareceu e ninguém soube qual era o seu paradeiro por 20 anos. Na época, o Califado Abássida controlava a cidade sagrada e este acontecimento marcou um grande constrangimento para os califas daquele período, pois o principal dever deles era permitir que os muçulmanos pudessem praticar a religião.
Foi então que, em 950, um vassalo dos Abássidas no Egito chamado Abul Misque Cafur conseguiu recuperar a Pedra Negra, mediante o pagamento de um imposto aos membros da seita.
Apesar de ter recuperado a Pedra Negra, o caso teve repercussão negativa, o que exigiu medidas que protegessem os peregrinos e a Caaba. Assim, a partir do ano de 964, foi selecionado um emir que ficaria responsável pelos assuntos relacionados à peregrinação, inaugurando o Xarifado do Hejaz.
A forma como os emires eram selecionados variou de acordo com o império que estava no comando do Hejaz. Ele perdeu influência no ano de 1350 quando o Sultanato Mameluco do Egito tomou o controle da região, mas voltou a vigorar quando o Império Otomano reconquistou a costa oeste da arábia.
No período Otomano, os xarifes voltaram a ter grande influência sobre Meca. Eles eram selecionados pelo sultão e sempre eram descendentes dos Banu Hashem, que pertencia à tribo dos coraixitas, o clã de origem do Profeta Muhammad ﷺ.
Meca sob controle dos wahabitas
Em 1916, o agente britânico T.E. Lawrence (conhecido pelo filme Lawrence da Arábia) iniciou uma conspiração contra o governo otomano ao lado do xarife de Meca Houssein bin Ali, e o conflito resultou na Batalha de Meca. O califado saiu derrotado e, em 1924, as forças sauditas tomaram o controle da região do Hejaz.
O que se seguiu nos próximos anos foi uma série de perdas históricas inestimáveis para os muçulmanos e para a humanidade. Mesquitas históricas foram fechadas, e locais onde viveram familiares e companheiros do Profeta Muhammad ﷺ foram completamente destruídos.
Em relação às mesquitas históricas fechadas, essas construções são parte de um complexo de sete mesquitas, que são:
1. Masjid Abu Bakr
2. Masjid Fatimah Az-Zahra
3. Masjid Umar Ibn Kathab
4. Masjid Ali Ibn Abi Talib
5. Masjid Salman al-Farsi
6. Masjid Saad bin Maaz
7. Masjid Al-Fath
Apenas a última ainda está aberta para visitação.
Além disso, outros locais da cidade foram demolidos, como a casa de Khadija, a primeira esposa do Profeta ﷺ, que atualmente é um banheiro público, e o lugar onde vivia Abu Bakr, que atualmente é o Hotel Hilton.
Embora a função de Meca seja ser um local para a peregrinação, algumas construções foram destruídas sem nenhum motivo aparente, como a casa de Ali-Oraid, neto do Profeta ﷺ, que foi destruída logo após ser descoberta em uma escavação.
A última construção demolida pelo governo saudita, em 2002, gerou grande comoção. A Fortaleza de Ajyad havia sido construída em 1780, durante o califado do Império Otomano, e era uma grande estrutura que tinha o objetivo de proteger a cidade de invasores. Em seu lugar, surgiu um complexo de edifícios comerciais.
Fortaleza Ajyad ao fundo, no canto esquerdo
Esta demolição gerou grande crise diplomática entre os governos sauditas e da Turquia. Na época, aqueles que eram contrários à destruição da fortaleza chegaram a propor um boicote à Arábia Saudita, mas sem sucesso.
Atualmente, estima-se que hajam cerca de 20 construções em Meca que sejam do tempo do Profeta Muhammad ﷺ. Entre 1985 e 2005, cerca de 95% dos edifícios com mais de 1000 anos foram demolidos pelos wahabitas.
Terroristas em Meca
Terrorista Juhayman al-Otaybi, líder do al-Ikhwan
Em 20 de novembro de 1979, uma tragédia abateu a Cidade Sagrada do Islam. Terroristas do grupo al-Ikhwan tomaram a Grande Mesquita, onde está a Caaba, de assalto e mantiveram vários fiéis que tinham ido fazer suas orações como reféns.
A ofensiva dos terroristas contou com o apoio de mais de 500 pessoas armadas e, entre elas, havia mulheres e crianças. O grupo era liderado por Juhayman al-Otaybi, um salafista puritano que alegava que o governo saudita havia traído os ideais da seita revisionista do Islam.
Juhayman al-Otaybi estudava Islam com o Grande Mufti saudita Abd al-Aziz ibn Baz, que foi responsável por disseminar fortemente a doutrina salafista no século passado. O terrorista, no entanto, alegava que o governo saudita havia traído os princípios que defendia, pois estava introduzindo uma série de hábitos ocidentais na sociedade daquele país.
O al-Ikhwan alegava que uma das lideranças do grupo, Muhammad Abdullah al-Qahtani, era a figura pré apocalíptica do Mahdi, que viria estabelecer a justiça antes do Dia do Juízo Final. Os terroristas acreditavam que o atentado na mesquita seria uma forma de fazer os muçulmanos se voltarem para a justiça e obediência.
No entanto, o que se viu foi um massacre que custou a vida de pessoas inocentes. A tomada durou até o dia 4 de dezembro, quando membros das tropas da Guarda Nacional da Arábia Saudita e do Exército da Arábia Saudita, com o apoio do Groupe d’Intervention de la Gendarmerie Nationale (GIGN) da França, conseguiram retomar o controle de Grande Mesquita.
A batalha custou a vida de 255 pessoas e outras 560 ficaram feridas. Entre os mortos, estava o autodenominado Mahdi, Muhammad Abdullah al-Qahtani.
Após o confronto, os membros remanescentes do grupo foram julgados, condenados e degolados em praça pública pelo governo saudita.
A Cidade Sagrada nos dias atuais
Complexo Abaj al Bait em Meca
Atualmente, Meca é uma cidade com uma infraestrutura moderna, com grandes avenidas, shoppings centers, arranha-céus e hotéis preparados para receber o enorme fluxo de peregrinos que vêm de todas as partes do mundo.
A Cidade Sagrada é um local multicultural que recebe anualmente milhões de peregrinos. Este ar cosmopolita se deve principalmente ao Hajj e à Umrah (peregrinação menor), que conta com a participação de cidadãos do mundo inteiro.
A última reforma da Mesquita al-Haram ocorreu no ano de 2011. Atualmente, ela tem capacidade para receber 2 milhões de pessoas e é o maior recinto religioso do planeta.
A economia é fortemente dependente da peregrinação e, durante todo ano, diversos setores se preparam para receber os muçulmanos estrangeiros. Além disso, boa parte da população local sobrevive da indústria ligada ao Hajj.
Em 2010, foram instaladas cinco linhas de metrô para ajudar os peregrinos a se deslocarem para os locais religiosos. Com exceção deste fato, a mobilidade urbana é totalmente dependente de táxis e carros particulares.
A cidade não possui aeroporto internacional em seu território. Dessa forma, os peregrinos chegam à Meca geralmente pelo aeroporto ou pelo porto de Jidá, que fica a 89 km de distância.
Pessoas não muçulmanas que tentarem entrar em Meca podem ser presas ou processadas legalmente de acordo com as legislação da Arábia Saudita.
Conclusão
De acordo com a tradição islâmica, a cidade de Meca foi fundada pelo Profeta Abraão e seu filho Ismael. O local foi indicado por Deus para ser um destino de peregrinação e adoração a Ele.
Com o passar do tempo, a população que vivia na região começou a adotar os costumes dos idólatras. Assim, Meca se tornou um lugar de propagação do politeísmo e de culto a estátuas com imagens de deidades.
Quando o Profeta Muhammad ﷺ nasceu, a cidade estava sendo dominada pela tribo dos coraixitas, que lucrava bastante com a peregrinação dos idólatras à Cidade Sagrada.
A cidade resgatou seu propósito original quando o Profeta Muhammad ﷺ a conquistou de forma pacífica e proibiu que praticantes de outras religiões, que não o Islam, habitassem e exercessem influência sobre Meca.
Ao longo dos anos, a cidade passou por muitas mudanças para receber o crescente número de muçulmanos que vinham de todas as partes do mundo. No entanto, Meca também sofreu com diversas guerras, saques e desastres que fizeram com que ela tivesse que ser reconstruída e reformada várias vezes.
Em 930, fanáticos religiosos de uma seita que praticava sincretismo religioso conseguiram saquear Meca e roubar a Pedra Negra, que ficou desaparecida por 20 anos. Mesmo tendo sido recuperada, o caso repercutiu de forma extremamente negativa e exigiu que as autoridades do Califado Abássida elegessem alguém responsável pela segurança e organização da peregrinação.
Naquela época, foi instaurado o Xarifado do Hejaz, que vigorou em Meca por quase mil anos, chegando ao fim somente em 1924, quando o clã saudita dominou a Arábia.
Sob domínio dos wahabitas, Meca modernizou sua infraestrutura e se tornou um ponto urbano da Arábia Saudita. No entanto, este avanço custou a demolição de importantes pontos históricos e sagrados, que haviam sido erguidos por companheiros e parentes do Profeta Muhammad ﷺ.
Atualmente, estima-se que existam apenas 20 construções do período do Profeta ﷺ, contrastando com arranha-céus, hotéis, avenidas e shoppings centers.
Mesmo com todas as mudanças sofridas, Meca sempre preservou seu significado para os muçulmanos e, até hoje, recebe milhões de peregrinos anualmente, que participam do Hajj e da Umrah.
A influência estrangeira, assim como o grande número de estrangeiros residindo na cidade, faz com que a Cidade Sagrada possua uma cultura cosmopolita e multicultural.
Atualmente, a economia de Meca e da região do Hejaz é fortemente dependente da peregrinação, e há vários setores que trabalham o ano inteiro para receber os muçulmanos vindos de todas as partes do mundo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário