As enfermidades do ego

Na verdade, entre os servos de Allah (Deus), os que temem são os sábios - 04/02/2015 - Autor: Abdul Haqq Calábria - Fonte: La Tribuna del País Vasco - Versão portuguesa de. M. Yiossuf Adamgy/Al Furqán

Prezados Irmãos, 

Assalamu Alaikum (A paz esteja convosco): 

Al Sulami foi um sábio sufi, persa, do século X que, entre outros tratados, escreveu um, intitulado “As enfermidades do ego e os seus remédios”. 

Não é necessário ser um iniciado na espiritualidade sufi para compreender os postulados desta obra. Os seus enunciados participam de um código destinado aos muridín (discípulos) e estão concebidos para o trabalho dos estados passageiros (al-ahwal) e estados perma-nentes ou estações (al-maqamat). No entanto, esta obra pode servir ao leigo como um guia universal e intemporal dos principais vícios de carácter do ser humano. Do ponto de vista da psicologia moderna, muitas das suas propostas podem parecer um disparate. Mas só se se tem em conta uma concepção egocêntrica da realidade, não uma cosmovisão teocêntrica como a de Al Sulami. 

Abu Hurayra (r.a.) relata que o Profeta (s.a.w.) disse: “A prova, a paixão e o desejo estão amassados na argila de Adão”. Este é o material moldável do carácter humano que pode levá-lo a uma escravidão pelo mundo ou a uma libertação através da iluminação interna. Com estas reflexões, em modo de prefácio, o autor adverte sobre a natureza dos assuntos que vão ser tratados no seu estudo. Seria inabarcável tratar de resumir aqui algumas das enfermidades descritas. No entanto, pela sua actualidade, interessaram-me algumas que parecem ter sido descritas como se Al Sulami tivesse regressado do outro mundo e tivesse dado uma olhadela ao nosso: 

...“Uma das verdades do ego é não aceitar nunca a verdade, pois a submissão é contrária à natureza do ego. Isto resulta principalmente da sua debilidade para resistir às paixões e aos desejos”... 

...“Uma das enfermidades do ego consiste em ocu-par-se dos vícios dos demais e fechar os olhos ante os próprios”... 

...“Uma das enfermidades do ego é a estima que se tem a si mesmo, e que sinta lástima pela situação em que se encontra”... 

Sobre a hipocrisia, tão presente nos nossos dias, Al Sulami disse: 

“Uma das enfermidades do ego é dedicar-se a embelezar as aparências; simular humildade sem a praticar verdadeiramente, fingir adorar sem estar presente na adoração”. 

O remédio correspondente é que o discípulo se dedique a preservar os seus segredos íntimos, para que sejam as luzes do seu foro interno as que embelezem as suas acções exteriores. Então estará embelezado sem adorno, será respeitável sem admirador, será forte sem apoios. Por isso disse o Enviado de Allah - que Allah lhe prodiga bênçãos e paz -: "Ao que corrige a sua vida interior, Allah corrigirá a sua vida exterior". 

Para a vaidade, Al Sulami dedica esta pérola: 

“Uma das enfermidades do ego é buscar ser o que mais sabe, engrandecer-se do próprio saber e mostrar - ante os outros - que sabe mais”. 

O remédio correspondente é ver a Generosidade de Allah para com o discípulo, porque fez dele um Recep-táculo das Suas disposições; e também praticar constan-temente a humildade, a contrição, a compaixão pelas criaturas e prodigar-lhes bons conselhos. 

Contam-nos que o Profeta - que Allah lhe conceda bênçãos e paz - disse: "O que busca a ciência para a luzir ante os sábios ou para discutir com os tolos ou para atrair a atenção, que vá procurando um lugar no inferno". 

E assim falavam os antigos: "O que aumente em conhecimento, que aumente em temor". 

Disse Allah: 

"Os sábios, dentre os servos de Deus, só a Ele temem, porque sabem que Deus é Poderoso, Indul-gente." (Alcorão, 35:28). 

Alguém perguntou a um Sha'bi: "Quem é o sábio?". E este respondeu: "O sábio é o que teme a Allah, o Altíssimo". 

Para concluir esta breve selecção, incluirei uma reflexão de Al Sulami sobre outro dos nossos vícios mais desbocados na actualidade, sobretudo no mundinho das redes sociais, meios de comunicação e reuniões presen-ciais formais e informais. 

“Uma das enfermidades do ego é a profusão de palavras. Esta tem duas origens: uma é o desejo de supremacia que leva o discípulo a querer fazer os-tentação do seu conhecimento e da sua eloquência; o outro é a ignorância do que há que dizer”. 

O remédio correspondente é que o discípulo tome consciência de que é responsável pelo que diz, e o que ele diz é inscrito numa conta, e que deverá res-ponder por isso; porque disse Allah, o Altíssimo: “Em verdade uns anjos custódios cuidam de vós; são nobres escribas” (Alcorão, 82:10). 

E disse também: “O ser humano não profere nenhuma palavra sem que haja junto a ele um anjo observador preparado” (Alcorão 50:18). Como disse o Profeta (s.a.w.): ”Toda a palavra do ser humano fica inscrita contra ele e é-lhe desfavorável excepto se é para exortar o bem ou para impedir o mal”.

Obrigado. Wassalam. 

M. Yiossuf Adamgy - 21/02/2015.